A terra do malte começa a produzir vinho
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A terra do malte começa a produzir vinho


Graças às mudanças climáticas, Christopher Trotter fará história no final desse ano casando um vinho branco escocês com mariscos locais.
 
Os lingueirões (ou “navalha”, uma espécie de marisco) colhidos próximo à costa, no Mar do Norte, cairão muito bem com as primeiras garrafas da vinícola de Trotter, ao norte de Edimburgo. A safra 2014 será especial para a Escócia, onde os habitantes locais destilam uísque e fabricam cerveja há séculos.
 
“A Escócia provavelmente tem sido um país mais consumidor de cerveja que de qualquer outra coisa”, disse Trotter, chef que também escreve sobre comida. O vinho não tem sido parte da cultura, disse ele, “até agora”. 

 
Trotter poderia também fazer um brinde em memória a um mundo que está desaparecendo. A mudança climática, que os cientistas dizem que é causada pelo acúmulo de gases que retêm o calor na atmosfera, está transformando as mesas de jantar e confundindo tradições na indústria global de vinhos, de US$ 270 bilhões. Na Europa, estações mais quentes estão perseguindo vinicultores italianos e espanhóis até o alto de colinas, fazendo da Alemanha uma campeã, incentivando agricultores na Polônia e espalhando o cultivo de uvas para vinhos por latitudes mais amigáveis a uísques e cervejas. E estão elevando o teor alcoólico e alterando os sabores de famosos vinhos da França.
 
A Vitis vinifera, a videira comum, é uma planta exigente. Os vinhedos florescem onde as temperaturas médias anuais variam de 10 a 20 graus Celsius. Clima muito seco, granizo ou muita chuva podem rebaixar ou destruir uma safra. 
 
Até 73 por cento das grandes regiões produtoras de vinho de hoje deixarão de ter as condições ideais até 2050, segundo um estudo do ano passado de Lee Hannah, cientista sênior da Conservation International, com sede em Arlington, Virgínia. Após as variedades da uva serem selecionadas por mais de um milênio pelas condições locais, na Europa, o aquecimento da Terra pode tirar os nativos de sua zona de conforto, segundo uma pesquisa de Gregory Jones, climatologista e pesquisador da Universidade Southern Oregon, em Ashland.
 
O aquecimento global já está, por exemplo, aumentando os níveis de açúcar nas uvas. Isso significa mais álcool nos vinhos. Na região de Bordeaux, sudoeste da França, onde a viticultura data de épocas romanas, os níveis de álcool subiram para 13 a 14 por cento, contra 11 por cento há 15 anos, escreveu Christian Seely, diretor-geral da proprietária de vinhedos AXA Millesimes.
 
Trotter disse que acaba de podar as videiras para mantê-las com 45 centímetros após um crescimento “incrivelmente vigoroso” no ano passado. Ele disse que está estudando espalhar conchas sob as videiras para reter o calor do dia, um truque que ele diz que foi inspirado em produtores franceses, que usam calcário para obter o mesmo efeito.
 
Para ter uma noção do futuro, os climatologistas estão olhando para 2003, quando uma onda de calor na Europa levou a região de Burgundy, na região central leste da França, à mais precoce colheita em mais de 650 anos e fez murcharem os frutos nos vinhedos de Bordeaux.
 
Por outro lado, o aquecimento global pode ser positivo para áreas como o vale do Reno, na Alemanha, e para produtores que estão provando os limites do frio na Polônia, disse Jones. Podkarpacie, a maior província produtora de vinho da Polônia, tinha menos de 40 vinícolas uma década atrás; agora, tem mais de 100, segundo uma associação da indústria local.
 
Por enquanto, os veados que comem seus frutos rosados são uma ameaça maior a suas vinhas, no norte de Edimburgo, do que o frio do inverno, disse Trotter.
 
Quanto a ter calor suficiente para amadurecer as uvas e poder fabricar vinhos saborosos, disse Trotter, “estamos tranquilos e confiantes”.
 
Fonte:  Exame



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