Bons Vinhos
O vinho que derrotou a guerra
 
 
Por Patrícia Ferraz
Cozinheiras e vinhateiros vivem às turras no Vale do Bekaa, no Líbano, uma das  regiões vinícolas mais antigas do mundo. É que faz parte das tradições  culinárias locais usar as folhas de uva frescas para enrolar o charutinho de  arroz e a vizinhança pula a cerca sem cerimônia para se servir do ingrediente.  Nos últimos anos, porém, a temperatura está cada vez mais alta e para proteger  as uvas do calor os produtores precisam deixar mais folhas no pé. Só que para  isso, tiveram de contratar seguranças para os vinhedos.
 
A história tem jeito de anedota, mas é pura verdade, contada por Marc Hochar, da  família proprietária do Château Musar, a vinícola mais famosa do Líbano.
 
Os vinhos do Château Musar são vendidos no Brasil desde 1995 e importados  pela Mistral graças a uma outra história, também com ares de anedota. Ciro Lilla  ouviu falar deles numa viagem a Londres, anos antes de se tornar importador. O  dono do Château Musar, Serge Hochar (o pai de Marc), havia sido eleito ‘homem do  ano’ pela revista inglesa Decanter em 1984 por fazer grandes vinhos em  plena guerra civil. “As uvas estavam no lado muçulmano, o Vale do Bekaa, e a  vinícola ficava no subúrbio de Beirute, no lado cristão. Às vezes ele nem  conseguia vinificar”, conta Ciro Lilla. Ciro provou os vinhos, se impressionou  e, anos mais tarde, quando abriu a Mistral, incluiu a vinícola no primeiro  portfólio.
 
 
Folhudas. Calor obriga produtores  a manter nas vinhas as folhas tradicionalmente usadas para enrolar charutos de  arroz.
 
Os vinhos do Château Musar não são fáceis. Originais, intrigantes, têm forte  mineralidade e incrível capacidade de envelhecer – mesmo os brancos. Eles são  longamente armazenados antes de ir para o mercado, coisa que os produtores fazem  cada vez menos, por causa dos custos.
 
O Château Musar Rouge, um tinto de perfume intenso e taninos finos (corte de  Cabernet Sauvignon, Carignan e Cinsault), passa um ano em barricas, outro em  tanque de concreto, vai para a garrafa e só chega ao mercado sete anos depois da  colheita. “Mas consideramos que está pronto a partir dos 15 anos, quando  taninos, álcool e açúcar formam uma unidade”, diz Marc Hochar.
 
 
História 
Vinhos de  uvas nascidas a mil metros em plantas centenárias.
São vinhos orgânicos, produzidos em altitude em vinhedos centenários –  tintos, a 900 m, e brancos a 1.200 m, em solo calcário. Os tintos não são  filtrados e envelhecem em madeira apenas 20% do tempo em barricas novas. A  filosofia é a da intervenção mínima. Tem sido assim desde sua fundação, em  1930.
 
A história da vinícola começou na 1ª Guerra, quando Gaston Hochar ficou amigo  de um major francês que era produtor em Bordeaux (Ronald Barton, do Chateau  Langoa-Barton). Ouviu as histórias do vinhateiro francês e se entusiasmou.  Plantou Cinsault, Carignan, Petit Verdot, Mouvèdre e começou a produzir. “Fez  umas quatro ou cinco safras sem saber fazer vinho”, diverte-se o neto Marc. Ele  conta que foi então que seu pai, Serge, com 17 anos, foi estudar enologia em  Bordeaux, onde teve como mestre Émile Peynaud, considerado o pai da enologia  moderna. Voltou para casa e assumiu a vinícola em 1959.
 
Até 1975, quase todo o vinho era vendido no Líbano. Mas em 1979, o crítico  inglês Michael Broadbent provou o tinto e elogiou. A fama correu. Em 1990, o  Château Musar já exportava quase toda a produção. Hoje, são 600 mil caixas por  ano.
Desde (muito) antes de CristoO Vale do Bekaa, no Líbano, é uma das regiões vinícolas mais antigas do  mundo. O vinho surgiu no Oriente Médio, há uns 6 mil anos. Até o islamismo, a  costa oriental do Mediterrâneo tinha uma importância vinícola semelhante à da  França e Itália, como ressaltam Hugh Johnson e Jancis Robinson no Atlas Mundial  do Vinho (Nova Fronteira, 2008). Mas, apesar da tradição, os brancos e os tintos  (comparáveis aos bordeaux, para os críticos ingleses) são pouco conhecidos no  Ocidente.
 
Fonte: Estadão
 
	loading...
	
  
- 
Na Onda Do 'turismo De Experiência', Ricos Brincam De Fazer Vinho Na França
A região francesa de Bordeaux é o lar de produtores de vinho como Château Lafite Rothschild e Château Margaux, e por isso pode parecer improvável que vinhos com nomes como "Duke of Juice" (duque do suco) e "Bone Ami" (trocadilho de bom amigo, em... 
  
- 
É Um Château Com Mais De 150 Anos De História, Mas Não é Da França
Quanto mais você adentra no mundo do vinho mais curioso e ansioso por aprender e provar rótulos diferentes você fica. Campo para desbravar não falta: os países que produzem vinhos já ultrapassam a casa das nove dezenas e o número... 
  
- 
Vinho Produzido Na Frente De Combate
 Há quatro anos que Karim e Sandro Saadé não visitam Domaine de Bargylus, os 12 hectares de vinha que plantaram em Jebel al-Ansariyé, na Síria. Desde que começou a guerra civil no país que os irmãos, cristãos ortodoxos, gerem a propriedade... 
  
- 
10 Dos Vinhos Mais Caros E Desejados Do Mundo
Por Eduardo Milan O que faz de um vinho um grande vinho? E o que faz dele um vinho caro? O tema é repleto de controvérsias. Entretanto, existem alguns pontos comuns entre aqueles que são considerados os maiores vinhos do mundo, aspectos esses que determinam... 
  
- 
A Mais Importante Região Vinícola Do Mundo
O poeta Carlos Drummond um dia escreveu : "É preciso fazer um poema sobre a Bahia ... Mas eu nunca fui lá." Na minha opinião, Drummond é um dos três maiores poetas da língua portuguesa - mas isso não me impede, cara-de-pau que sou, de parafraseá-lo... 
Bons Vinhos