Bons Vinhos
O homem do nariz biônico
O francês Alexandre Schmitt tem na sua cabeça mais de duas mil referências olfativas, é tido como o melhor nariz do mundo, mas diz que todos cheiramos da mesma forma. Não fomos é educados para a sensibilidade ao prazer e não sabemos como o descrever.
Nem sempre parece fácil distinguir os aromas quando apreciamos um vinho e a verdade é que, na sua quase totalidade, eles não são perceptíveis sem um treino adequado. Mesmo para profissionais experientes que diariamente lidam com as especificidades técnicas do vinho, como é o caso dos enólogos, entende-se que serão capazes de detectar apenas algumas dezenas entre os mais de 600 compostos aromáticos que se considera integrarem uma garrafa de vinho.
Não é o caso de Alexandre Schmitt, um francês que tem na sua cabeça mais de duas mil referências olfativas, sendo, por isso, considerado por muitos como o “melhor nariz o mundo”. Entende, no entanto, que a principal diferença está sobretudo no treino e na aprendizagem, já que basicamente todos cheiramos da mesma maneira. A questão é que a nossa sensibilidade está sobretudo orientada para a visão e para o ouvido e temos dificuldade em identificar os estímulos olfativos.
“Quando visualizamos não sabemos como pensar”, explica, acrescentando que o que faz falta depois é ligar a imagem (da visão) com as sensações (dos aromas) e pôr-lhe palavras para as exprimir. “Todos cheiramos da mesma maneira, não melhor nem pior, a forma e percepção é que é diferente e é por isso que tem que ser educada para se tornar cada vez maior e mais melhor”, assegura.
Schmitt vem do setor dos perfumes mas está hoje profundamente implicado com os aromas do vinho. É diplomado em química e em perfumaria, criou perfumes para grandes marcas em Paris e em Londres, estudou também música e ocupa ainda parte do tempo com a escrita de novelas. Uma personalidade que pode ajudar a explicar sua especial sensibilidade para entender o complexo mundo dos aromas.
Para lá das aulas que atualmente ministra na Faculdade de Enologia da Universidade de Bordeaux, colabora também com alguns dos mais conceituados produtores da região e corre literalmente o mundo para ministrar cursos de olfação. Entre os já beneficiaram dos seus ensinamentos estão os responsáveis pelo mítico Château Pétrus, das adegas Opus One, Mondavi, Torres e técnicos do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto.
Da velha questão do cheiro animal e dos odores a couro ou suor de cavalo aos aromas balsâmicos, resinosos ou de madeira com que vemos normalmente catalogados os vinhos, tudo é abordado em seus cursos. Schmitt explica também que uma das coisas que mais facilmente identificamos é o aroma doce, o que advém do fato de ser essa a primeira sensação que adquirimos com a absorção do leite materno. “Parker deve ter gostado mesmo muito do leite da mãe”, ironizou, numa referência ao americano Robert Parker, que é tido como o mais influente crítico de vinhos e contaminou a produção mundial com o seu gosto por vinhos doces e concentrados.
Mais que identificar, o trabalho de Alexandre Schmitt consiste sobretudo em ajudar a pôr palavras nas sensações, já que, ao contrário daquilo que acontece com a visão e a audição, nos falta o vocabulário para exprimir aromas e sabores. Um problema da educação recebida ao longo da vida, a qual é sempre mais orientada para as sensações de perigo que para as de prazer.
Estudos comprovam e revelam que que a nossa percepção é dominada pela visão (60 a 65%), seguida pelo ouvido (20 a 25%) e o tato (10 a 15%). Para os aromas e sabores dedicamos apenas à volta de um por cento. Ou seja, encaramos a vida com tal receio do perigo que acabamos por nem dar atenção ao prazer.
Portanto, pare de dar tanta importância a coisas que não dão prazer e aprecie tudo que uma boa taça de vinho pode lhe proporcionar.
Fonte: Público
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