Medo de que?
Bons Vinhos

Medo de que?


A Serra Gaúcha é uma região vitivinícola singular, única.

Seu perfil produtivo, sua geografia sinuosa, seus habitantes com o sotaque arrastado, seus costumes, cânticos e gastronomia formam parte do maior patrimônio cultural do Rio Grande do Sul. Não há igual na América do Sul.

A Serra se destaca pela excelente distribuição de renda, uma das melhores do país, graças ao perfil minifundiário das propriedades vitícolas. Na região, mais de 15.000 famílias vivem da uva e do vinho, quase todas de descendência europeia, do norte da Itália. As cabeças virtuosas acham que o pequeno produtor é digno de pena, precisa ser protegido, conduzido, “comandado”. A realidade é que se trata de um empresário dono de seu negocio, de seu nariz, de seus erros e acertos. E podem ter certeza que os acertos são maioria.

A vitivinicultura de uma região é feita, se constrói pelas mãos calejadas do pequeno produtor.
Ele tem a vitivinicultura no sangue, herança de seus antepassados, no DNA.
Ele não vê a uva e o vinho como um negócio, que precisa ter retorno, que deve ser depreciado, que tira o sono.
Ele faz tudo por amor, com paixão, sem medir esforços. E essa paixão é percebida no olhar, nas palavras, nos gestos.
Ele, ao receber pessoalmente o visitante em sua pequena cantina, com simpatia e receptividade, faz muito bem para a imagem da região, faz muito bem ao vinho brasileiro.

Um tempo atrás participei de uma inútil reunião para discutir a estupidez da implantação do selo fiscal com um gênio da CONAB, numa pequena cantina. A reunião transcorreu no meio das pipas de madeira e me lembrei das velhas épocas da De Lantier. Ao final da reunião descobri que a cantina era da família Cristofoli, dos descendentes do saudoso Duilio, produtor de uvas com o qual tive o privilegio de conviver nas décadas de setenta, oitenta e noventa. Duilio era uma pessoa que iluminava nossa cantina quando chegava cantando, contando causos e piadas, sempre alegre. O corpo forte como um touro escondia um coração enorme e uma pureza própria do homem de campo simples e direto. Descobri nesse dia que sua neta Bruna, formada em enologia, tinha assumido a missão de dar continuidade ao legado do vô, agora fazendo vinhos de seus vinhedos, de boa qualidade, preservando o nome com dignidade.
Este exemplo se aplica a outros produtores como Zanini, Anghebem, Carraro, Brandelli e centenas mais que desiludidos do modelo de manter vinhedos para fornecer suas uvas às grandes cantinas, iniciaram a carreira solo. A saída das grandes empresas multinacionais, que muito fizeram para construir a região, que parecia presságio de um negro futuro, estimulou que muitos viticultores completassem a cadeia produtiva elaborando seus vinhos e colocando-os no mercado. Estas pequenas cantinas constituem o futuro da região, são as que agregam valor, por isso devem ser apoiadas, valorizadas, destacadas.

A criação do Vale dos Vinhedos criou uma ferramenta fantástica de subsistência destas vinícolas e de valorização do produto nacional. Este exemplo que está sendo seguido por outras regiões ajudará a acelerar o fortalecimento da imagem de nossos produtos. Se algumas lideranças não reconhecem estas ações como o caminho lento a ser seguido, pelo menos que não atrapalhem criando selos e tomando medidas aparentemente em defesa do setor mas contrárias aos interesses dos consumidores.

Argentina e Chile, países produtores que invadem o mercado com um volume importante de vinhos baratos de qualidade duvidosa, não possuem uma estrutura produtiva com tanta carga de tradição e cultura.

Então, medo de que?



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